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"Todos sabemos que cada dia que nasce é o primeiro para uns e será o último para outros e que, para a maioria, é so um dia mais."
José Saramago

terça-feira, dezembro 18, 2007

Escravos do azar




(Ver também: Turno da noite)

Regresso ao 'turno da noite'. Volto a deixar de ser a Mária, estudante, e transformo-me na mari, observadora.
Mais uma noite gelada. Hoje concentro-me apenas numa parte da população, dispersa pelos vários cantos do nosso mundo. Refiro-me aos escravos do azar.

Passam vidas inteiras na rua.
Alimentam-se de ar, muitas vezes poluído, e tudo o que recebem é tantas vezes desprezo.
Agarram-se à vida que não têm, com que gostavam de sonhar. Temem!
Alguns desejam apenas saúde e um sítio para dormir.
São pequeninos e esqueléticos mas conseguem ter um coração enorme!
São os escravos do azar.
Dos recém nascidos aos mais graúdos, nenhum pediu para nascer, nenhum imaginou que a vida seria uma morte antecipada.
Infelizmente, a maioria de nós só olha para eles nesta altura do ano, em que os corações ficam mais abertos, em que a sensibilidade anda no ar.
Também será estranho e de apontar o dedo o facto de eu escrever sobre este tema precisamente agora.
Na realidade, também eu ganho mais afectividade a estas causas nesta altura em que o frio aperta, esquecendo tantas vezes que o calor não lhes mata a fome.

Eu achava que o Natal era uma época hipócrita, talvez a mais hipócrita do ano, em que as pessoas sorriem porque fica bem, ajudam para não parecer mal.
Hoje tenho dúvidas.
Começo a pensar que, pelo contrário, esta é a única altura em que não existe receio de sorrir e de dar, nem medo de ficar com um pouco menos para dar um pouco mais a quem nada tem.

Aos escravos do azar!
Aquelas pessoas simples que sorriem com tão pouco, que contagiam tanto com apenas um sorriso, para quem uma insignificância vale o mundo.
Aboliu-se a escravatura mas os escravos continuam a existir em números estrondosos, no nosso país e no mundo inteiro.
São os escravos do azar.

Hoje volto a ser metade de mim, escrevendo e divagando à média luz, sob a lua coberta de nuvens.
Resta-me acreditar na consciência das pessoas e na força (quase sobrenatural) dos sobreviventes, aqueles escravos à força, nesta noite húmida e fria, que não lhes consegue servir de abrigo.


Sorrir-lhes será o primeiro passo?...

7 comentários:

mari (a)penas... disse...

Este post pode ser lido de várias formas. Só a parte cinzenta, só a parte mostarda ou ambas :)

Bjinho***

AC disse...

Normalmente ignoro.
Quem me conhece sabe que mais facilmente perco tempo com um Vira-Lata que com uma Pessoa...
Não sou hipocrita, sou desumano, os dias ensinaram-me a sê-lo e poucas vezes me combato.

Optimo post Mari, das 3 versões prefiro a integral, e que SEJAS Natal todos os dias.

Abraço muito grande, que te duplique a vontade de continuar a fazer coisas bonitas.

Visão Caleidoscópica disse...

A noite faz-nos pensar...
Ilumina-nos e devolve a percepção que a luz do dia nos ofusca.
E é boa conselheira!
Talvez por isto, ao entrares no teu "turno da noite", a tua alma sensível se abra às tristes verdades que a todos rodeiam. Esta é de facto uma delas: a miséria e desalento de quem é posto neste Mundo para sofrer mais que a conta. Quem deveria ser tratado com a dignidade que qualquer criança merece, mas que em vez disso sofre o desprazer da dor, da míngua, de nem saber verdadeiramente o que é o aconchego de um lar, o carinho de uma família, uma razoável Ceia de Natal ou, até, um presente para si numa árvore de Natal.
Tristes histórias que pululam e se repetem por toda a parte... ao virar de cada esquina.
E tantos de nós que passam e nada vêm,ofuscados pela pardacenta luz do seu próprio bem estar.
Sempre distribuí sorrisos...dei a mão...fiz o que pude!
Porque Natal é sempre que um Homem quizer!
Mas sim, concordo que nesta época de boa vontade, muitos já se preocupam um pouco mais com as realidades de outros tantos que nos cercam.Não tanto por hipocrisia, mas porque deixa os seus corações em paz.
Mas aos que nada têm, pouco importa a razão porque vem....importa sim que algo lhes chegue às mãos ou bocas famintas.
Que seja sempre Natal Mári!
Adoro sentir-te como és!
Um enorme beijo em ti.
Até mais....

Anónimo disse...

Talvez devesse-mos olhar para o Natal como o menino que nasceu numas palhinhas deitado quando ninguém queria acolher aquela mãe que estava prestes a dar à luz….
Aquele menino tornou-se homem e uma esperança para muita gente!

Vive-mos “graças a Deus” numa sociedade capitalista e consumista onde podemos considerar-nos ricos…mas será que somos ricos em humildade e caridade?
Em quem acreditamos afinal? Num Pai Natal que dá presentes a quem se porta bem ou num Menino Jesus que na sua humilde vida dedicou-se aos mais pobres e àqueles que mais precisavam?
Qual a verdadeira mensagem do Natal? Não sei….
Mas sei que a esperança é a ultima a morrer e o mundo pode se tornar um pouco melhor, basta ajudar a pessoa que está ao nosso lado ou aquela que mais precisa.

Um sorriso, um abraço, um gesto vale sempre a pena, quando é dado por amor, carinho e afecto.

Beijinho

O Profeta disse...

Para ti que me visitaste
Ao longo destes poucos meses
Ofereço-te uma prenda singela
Uma estrela de mil cores

Roubei-a ao firmamento
Deposito-a na tua mão
Para que neste Natal
Te ilumine o coração

Um Santo e Mágico Natal


Doce beijo

somentebia disse...

Minha querida Mari: tocou-me fundo na alma esta tua postagem! Nada a dizer... volto outra hora! Deixo-te uma lágrima, uma pétala e um beijo, nesse coração tão lindo que tens.

pin gente disse...

quantas vezes aqui vim sem deixar uma palavra!
devia ter tantas, não era?
não tenho...
será que sorri-lhes será o primeiro passo? esse passo seria tão fácil para mim! bem mais que as palavras, que continuo a não ter...

para ti, um beijo
luísa